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Wednesday, November 12, 2014

Cabelo curto não pode?

Minha mãe sempre teve cabelão, chegou a passar da bunda. E cabelo "bom", escorrido e fino. Mas depois que o cabelo prendeu em alguma porta, ela decidiu cortar, mas não muito curto. Daí ela envelheceu e não queria ficar com "cabelo de crente", porque velha com cabelo comprido só pode ser evangélica, se não, tem que ter cabelo curto pois não combina com a idade.

Meu cabelo, por consequência, sempre foi comprido. E muito. No prézinho, tenho uma foto com uma cabeleira de dar inveja as menininhas de 5 anos de idade. Preto, liso, fino e comprido. De tanto colarem chiclé e pegar piolho, mamãe passou a tesoura, mas não muito curto, de qualquer jeito.

Sempre que dava, me ajudava a me lembrar que graças a Deus não puxei o black power do meu pai "porque ali não passa nem água" e ele sempre de cabelo raspado, nunca vi o famoso black power a não ser em fotos. E pra ajudar mostrava as fotos das minhas primas com o cabelo raspado, porque é ruim demais e não dá pra cuidar, então hoje elas tem pavor a cabelo curto, trauma de infância. Eu cresci achando que cabelo crespo era ruim, embora sempre achasse muito lindo.


Até que um dia me revoltei com a sociedade. Me via gastando rios de dinheiro para tirar os lindos cachos que herdei do meu pai e descolorindo (e destruindo, literalmente) o meu cabelo todos os meses. Já não aguentava mais gastar tempo e dinheiro para manter aquele padrão liso-e-loiro. Fui no salão como num impulso e o dono chegou a falar que não ia deixar eu cortar o cabelo. Por sorte, encontrei o melhor cabeleireiro do mundo que viu que eu realmente queria fazer aquilo. Cortar as madeixas era o que eu mais queria.

E aquela frase "menos é mais" nunca fez tanto sentido na minha vida: menos cabelo pra mim significou menos tempo gasto, menos dinheiro, menos auto-cobrança. Só que muito mais rótulos, cobranças externas e autoconfiança. Todos me diziam que eu era louca, que tinha "acabado com o meu cabelozzZZZzz" ou me perguntavam se eu tinha virado lésbica. E a resposta, sempre foi a mesma: mas gente, cabelo cresce! 




Quando fiquei 1 ano fora do país não quis gastar meu dinheiro suado com cabelo e ele cresceu. Uma das minhas primas, quando voltei e ela viu meu cabelo comprido, pegou eles pela raíz com força e disse que se eu cortasse de novo ela me matava.

Então enjoei de novo e resolvi cortar, para desespero da minha mãe e de algumas amigas. Uma colega do trabalho quase chorou quando viu. E a enxurrada de comentários questionando a minha sanidade mental e sexualidade voltaram. Fora a máxima: e o seu marido deixou?, o que me faz querer vomitar meus órgãos quando ouço.

Só um lembrete para as pessoas que acham que o (in)consciente coletivo fala mais alto do que o meu gosto: PAREM!

Não é o meu cabelo que define a minha sexualidade, não me deixa menos ou mais feminina ou mulher. Meu cabelo não é propriedade do meu companheiro, assim como meu corpo, minhas roupas, minhas decisões e opiniões também não pertencem a ele.
Eu "acabava" com o meu cabelo quando eu gastava tanto com químicas para mantê-lo de uma forma da qual não era exatamente o que eu queria, mas o que eu achava que queria.
Meu cabelo é uma extensão da minha personalidade: não tenho medo de mudar de corte, cor e muito menos de opinião, quando eu achar conveniente.

Expressar opinião é diferente do que ridicularizar uma escolha. Expressar opinião é diferente do que julgar pela aparência. Expressar opinião é diferente do que tentar impor a própria opinião.

Só parem de dizer que existem idades para cada tipo de cabelo, que a pessoa tem que ter um biotipo específico para usar algum corte ou penteado para "ficar bom". O cabelo é meu e eu faço o que quiser com ele, obrigada!

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